sábado, 4 de março de 2017

Solidão de uma Meretriz

Noites são retalhos, retalhos costurados na solidão. Mas nenhuma solidão é tão impactante quanto à de uma puta. Do balcão do bar a gente vê e ouve de tudo, frequentemente observo os lamentos. Com a cerveja barata no copo americano a vagabunda como é chamada pela sociedade conta sobre sua rotina...
Tem noites em que ela é desejada, procurada e usada por homens de todo tipo. Mas depois, quando chega a madrugada, onde os homens vão embora, se recolhem para dormir com suas imaculadas esposas, é a hora que a meretriz esvazia o corpo de todas as porras que passaram por ela e deita-se sozinha em um colchão duro, ao seu lado somente os retalhos de solidão.
Ela se esforça, mas não consegue adormecer, apesar do cansaço físico e mental. Os pensamentos doem, e por mais que ela tente afastá-los, não há nada de nobre na sua solidão.
Da janela do cortiço ela acende um cigarro todas a noites. A cada trago, ela engole um pouco da alma. A cidade abaixo da sua janela do último andar ainda vive, embora só pessoas como ela, mantenham-se em movimento. Todos os boêmios trazem seu retalho de solidão no bolso.
A fumaça do cigarro tenta esconder alguma dor. Ela afirma repetir com a voz firme "sou livre", tentando convencer a si mesma que isso é uma verdade. Apaga o cigarro e o joga a bituca pela janela, coloca a cabeça fora, enche o pulmão de ar e grita: "livre, vocês entenderam?" Não há resposta. Nem mesmo um eco.
O desassossego fica repetindo: "Livre?.Tu é só a mulher que todos desejam na cama. No final sempre dorme sozinha"
Deitasse, nua. Pela cortina aberta olha para o céu em busca das estrelas, achando que elas trazem respostas e não há nenhuma.
Ela tenta, mas não lembra com clareza de quantos homens naquele dia ela satisfez... E naquela semana? Naquele mês? Finge não se importar com isso, em ser somente um objeto de prazer.
Ela mesma acaricia seus cabelos, abraça o travesseiro, tática que usa desde criança para acalentar suas dores. Sussurra uma canção de ninar até que sua voz se perde. Ela adormece. A prostituta livre, sem sonhos que na próxima noite fará tudo novamente, sem sua dor ser notada uma pessoa se quer...